domingo, 6 de dezembro de 2009

Os meio honestos


Por MARTHA MEDEIROS

Tenho lido as mais diversas opiniões a respeito de como deve jogar o Grêmio no próximo domingo contra o Flamengo: há os defensores de o time entregar o jogo para não permitir que o Inter seja campeão, e há os que defendem a dignidade acima de tudo: tem que jogar pra valer e seja o que Deus quiser (tudo indica que Deus vai querer ver o Rio de Janeiro em festa, mesmo que o Grêmio dê tudo de si...).

Na lista das minhas preocupações cotidianas, o futebol nem entra. Ele está, no máximo, na lista das minhas diversões, e não chega a ocupar os 20 primeiros lugares. Ocupou, na minha adolescência. Hoje, é uma alegria pontual, que acontece apenas em finais de campeonato e em jogos de Copa do Mundo, quando o Inter e a Seleção Brasileira estão em campo. Sou colorada, é sabido. E brasileira.

Como colorada, obviamente que eu adoraria que o Grêmio goleasse o Flamengo dentro do Maracanã, e se vencer com jogadores pouco experientes, tanto melhor: seria a chance de despontarem novos ídolos. Mas essa sou eu, uma reles mulherzinha cujas paixões insanas estão reservadas para outros setores da vida, jamais para o futebol, e que nunca se importou de o Grêmio vencer campeonatos, desde que o Inter já estivesse fora do páreo. Desculpe a inocência.

Pelo que me foi dito por quem tem melhor memória do que eu, os colorados também já fizeram das suas para prejudicar o Grêmio. Se é verdade que o Inter algum dia jogou propositadamente mal, então também não honrou os próprios calções.

Rivalidade tem limite. Pode ser algo divertido e infantil, no que a infantilidade tem de melhor, que é o nosso resgate dos tempos do colégio, das gincanas, das turmas de rua. Natural que, mesmo crescidos, o espírito de disputa permaneça, que se diga “bem feito” quando o lado de lá perde, que se toquem flautas, que se soltem foguetes quando nosso adversário leva um gol. Coisa de piá.

O limite da rivalidade é extrapolado quando deixamos de ser gremistas ou colorados para virar um tipo de torcedor mais agressivo: aquele que é, antes de tudo, antigremista ou anticolorado, e que torce mesmo é pela humilhação do oponente em qualquer circunstância. É o lado perverso da infantilidade: são homens e mulheres que não conseguiram transpor os ritos de passagem, não suportam se sentir inferiores e confundem o futebol com uma espécie de religião. Aí deixam de pensar.

Se você fosse mãe ou pai de um jogador de futebol que entrasse em campo pressionado a perder, que conselho daria a seu filho?

a) “Faça o que seu patrão mandar. Emprego não anda fácil.”

b) “Se você é macho, jogue mal e ferre seu inimigo. Honra é pra boiola.”

c) “Quem tem escrúpulo, tem todos os dias. Não é desonesto no domingo e depois compensa sendo honesto na segunda-feira.”

Tomara que estejamos de acordo sobre escrúpulos, não só pro bem do futebol, mas pro bem do país, que está precisando.

Fonte: Jornal Zero Hora - dia 02 de dezembro de 2009

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